segunda-feira, 25 de abril de 2011

. Eu sou um Dasein!




            - Próximo!
            Ele entrou no consultório do Dr. S. Ele estava incomodado desde a sala de espera. O consultório era vazio, rude, paredes rústicas, móveis desagradáveis aos olhos de quem vê. Tudo era tão diferente do que se via nos filmes e novelas. Sentou-se.
            - Em quê posso ajudar? – disse o Dr. S.
            - É que eu estou com uns caroços na cabeça. Isto está me deixando cansado. Dói. Coça. E mal consigo dormir com dores de cabeça. – ele dizia isto olhando para as paredes.
            - Você vai tomar 2 doses de “X” por dia, 1 de “Y” de 8 em  8 horas e 2 de “W” de 2 em 2 dias. Volte aqui em 30 dias.
            A consulta durou 1min e 11 sec.
            Dia da volta...
            - Olá! Tomei todos os remédios e não melhorei. Meus caroços estão tão doloridos que mal consigo lavar os cabelos.
            - Ah... Estes procedimentos são lentos mesmo... Isto vai demorar muito a sanar. Vou lhe receitar doses de “U”, de “T” e de “F”. Volte aqui em 30 dias.
            - Espera aí, S. Eu sei que você tem um monte de pacientes para atender hoje – um monte, dos quais, apenas 1 ou 2 serão olhados nos olhos (e já estou tomando o lugar de um). Eu imagino como deve ser difícil trabalhar nos Serviços Públicos de Saúde. Eu trabalho, pago minhas contas e meus impostos, e é com este dinheiro que você come seu pão quentinho todos os dias. Veja bem: Eu preciso que você olhe, neste momento, para mim e deixasse a “doença”, que me acomete, um pouco de lado. Eu preciso que você seja mais sensato a me ver. Esta já é a segunda vez que venho aqui e você, sequer, sabe a cor e o diâmetro que estes caroços têm. Eu poderia estar com um câncer e em três meses morrer, por ele, sem nem ter sabido - por você ter negligenciado a ele e a mim. O fato é que estes caroços me incomodam (assim como um calo lhe incomoda, quando você calça este seu sapato branco que custa cerca de R$ 300,00, e que foi pago com o dinheiro de todos aqueles que sofrem lá fora). Gostaria que você me visse como um todo. Não é minha “doença” quem sofre, mas sou eu por completo que estou sofrendo. É horrível quando alguém me diz “Nossa, você tem caroços na cabeça!” e eu respondo “É...”. Enfim, eu não aguento mais. Isto está danificando minhas relações pessoais. Eu sou um ser humano, como todos que estão lá fora. E, o fato de chegar até aqui e lhe fazer tal reclamação não faz de mim um “menos humano”, mas o simples detalhe que falta no seu atendimento, está lhe tornando o “menos humano” que você nunca desejou ser. Tenha um bom dia! – e retirou-se.

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